por: Isailde da Cruz Rodrigues(*)
Eu nasci em 6 de julho, sou de câncer e estou com câncer. Não estou com “aquela doença”, nem com “CA”, é câncer mesmo, sem nenhum estigma. Não, eu NÃO SOU doente, eu ESTOU doente. Sintomas? Nenhum. Mas o “bixinho” continua lá e eu cá. É possível ser feliz com câncer? Sim, é possível. É duro, mas é possível. O câncer nos faz ser ainda melhores do que somos. O que é a cura? Curar é transformar!
Já estou em tratamento. Tive meu primeiro dia de quimioterapia e não senti nada. Graças à Deus! Só um pouco de barulho, porque as minhas acompanhantes (Só o SUS VIP que permite) são muito bagunceiras. E, nesse momento, já estou me curando, pois estou sendo capaz de transformar a minha dor em experiência criativa, compartilhando-a de forma positiva com outras pessoas, as que têm câncer e as que não têm. Afinal, a vida não dá certeza para ninguém, não é mesmo? Mesmo eu gostando de tamarindo (essa foi bem azeda, aff!), tô fazendo um suquinho bem levezinho...
A minha idéia de tornar público essa minha doença é questão de dignidade. É uma maneira de ajudar outras pessoas, assim como eu. Esclarecer, acabar com o preconceito, acabar com a blindagem: Eu não bebo, nem fumo, alimentação saudável, nada sedentária, não tenho histórico de câncer na família e nem namoro em pé... rs. Isso num me pega. Cuide-se!
E diante de uma dúvida, um “noduluzinho” no seio (eu jurava que era verme pq só ando descalça), protelei e foi passando... Até que, numa consulta “bobinha”, por desencargo de consciência, foi solicitado biópsia. Gente do céu, como esse nome assusta! E depois desse resultado bombástico... Estava eu com o exame na mão, com o termo “maligno”. Sabe que nunca pensei em ter câncer... Quer dizer, tinha medo! Acho que todo mundo tem um pouco, mas é uma coisa que acontece com os outros... somente com os outros! Logo o mesmo linfoma da presidente, e eu nem vereadora sou.
Tive um luto de 3 dias. Dei-me de presente. Chorei. Choramos por medo. Medo de não ser forte; medo de se deixar abater, de mudar meu espírito otimista e de deixar de ser eu. E num é que no fundo do meu poço tem uma mola!!? No quarto dia, levantei, fiz escova... E tome batom! Usei minha melhor roupa (parecida com a dos meus quinze anos). E pronto!!! Mulher e índio quando se arrumam ficam prontos para qualquer guerra.
É uma força, inerente ao ser humano! E tem demonstrado que a dificuldade, a tragédia, o fracasso e o desapontamento podem servir como um impulso para a mudança e o crescimento. Que seja uma guerra, mas eu creio que, com perfume e salto, se eu não conseguir acabar com meu inimigo, pelo menos eu o conquisto... rs
E todo dia é uma palavrinha nova que eu aprendo. O verdadeiro significado de “Resiliência”. E lá tava: “Persistir nos momentos difíceis mantendo a esperança e a saúde mental”. Entendi que pessoas altamente resilientes tornam-se mais fortes após situações difíceis. Por que isso acontece? Porque elas desenvolvem confiança em si mesma aprendendo novas formas de lidar com as adversidades.
Bingo!!
Quer dizer que é aprender, adaptar-se e em última instância é se dispor à mudanças? Isso é ser resiliente? Eu sou esse negócio aí, pronto! E tudo mudou... Tenho necessidade de dividir, a gorjeta aumentou, menino chorando eu pego no braço, atravesso velhinho no sinal independente da vontade dele. Quero ajudar e pronto! E o olhar? Muda. Admiro tudo! Acho lindo as formiguinhas andando, o sol, a lua, a coxa do frango é mais saborosa, enfim, sinestesia total. E não é que tudo vem de forma natural!!? É uma força que não sei... Aliás, até sei, só não sabia que vinha de forma tão suave. Espiritualidade é essencial! Por mais que a gente acredite numa força superior. Comigo meu encontro com Deus foi na angústia, mas foi. E agradeço. Eu, sinceramente desconfio que Deus tenha dito bem baixinho: Agora tu toma siso, nega!
E quero aprender tudo que essa doença tem para me ensinar, não quero perder 1 minuto. Porque ela veio, eu não sei, mas para quê, eu sei: Veio para me sentir mais forte, fortalecer-me na fé e dá valor às coisas mais essenciais para minha felicidade, que custa tão pouco. Jamais vou deixar que o câncer tire o que eu tenho de mais precioso: minha alegria de viver. Logo, logo a doença vai passar e as coisas boas que ela me trouxe que talvez eu ainda não tenha percebido claramente, vão permanecer. Vivo cada minuto de uma vez e amo mais do que qualquer coisa.
Só tenho que agradecer, minha gente, aquele cheiro meu, minha família, meus amigos e os profissionais da área que antes eram só conhecidos e hoje já fazem parte da minha vida diante de tanto carinho. Nesses momentos que a gente reconhece os nossos. Seguram minha mão com riso, com piadas bestas (amooo!), mas é disso que eu preciso!
Já dizia o poeta: “Sou capaz de gostar de tudo, menos do sofrimento. Quanto menos se fala nas aflições da vida, melhor”.
Portanto, só não me venham com livros de auto-ajuda, e que “ainda há esperança”. De muito bom grado, eu aceito livros do Costinha, Tiririca e videos da Janete a Valéria. Venham-me com um sorriso, um abraço, uma piada... Nada de frases genéricas. Basta um riso, uma esperança para meu peito consertar. Afinal, tenho 99% de chances e esse 1% eu digo que é de cabelo... rs
E agora, força na peruca!!
(*) Formada em Letras(URCA), Empresária e continuando a sonhar...
contato: isailde1@hotmail.com
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