"Você tem boas exceções. Mas a regra é a seguinte: o filho não dá para nada, vai ser vereador ou deputado estadual."
(Jornalista Ricardo Mota)
Alagoas: em família desde a proclamação da República
Dos 12 representantes alagoanos no Congresso, dez são de família de políticos, como Renan Filho, sucessor de Renan Calheiros. Aliado de Renan, Collor encontra dificuldade para fazer herdeiro político
Renan Calheiros comanda a oligarquia atualmente dominante no estado de Alagoas |
O primeiro presidente da República era de Alagoas: o marechal Deodoro da Fonseca (1889-1891). Dezenove anos depois, um sobrinho dele assumiu a Presidência – o marechal Hermes da Fonseca (1910-1914). Oito décadas depois, um político alagoano subiu a rampa do Planalto pela primeira vez: Fernando Collor de Mello (1990-1992). Neto de deputado e filho de senador, Collor botou uma prima no Ministério da Economia e um primo no Supremo Tribunal Federal (STF) durante seu breve mandato.
A política pode nem sempre ser a mais republicana. Mas nunca deixa de ser familiar em Alagoas. Dos 12 representantes alagoanos no Congresso, apenas dois – os deputados Givaldo Carimbão (PSB-AL) e Rosinha da Adefal (PTdoB-AL) – não são de família de políticos.
A bancada alagoana dos parlamentares que têm parentes na política reúne o mais rico dos 594 congressistas, o irmão de um ex-deputado foragido da Justiça, além de nomes controversos, que, apesar de terem vivido momentos de altos e baixos no cenário nacional, nunca deixaram a ribalta local, como os senadores Fernando Collor (PTB-AL) e Renan Calheiros (PMDB-AL).
Collor e Renan
Eles foram inimigos, aliados, inimigos e agora, novamente, são aliados. Alvos de duas das mais graves crises políticas da história recente do país, Collor e Renan vêem seus herdeiros políticos viverem momentos distintos. Enquanto o ex-presidente da República ainda não se recuperou totalmente da queda, em 1992, o ex-presidente do Senado marcha alheio aos escândalos que quase lhe custaram o mandato em 2007.
Nas últimas eleições, Renan renovou o mandato de oito anos e elegeu deputado Renan Filho (PMDB-AL). Os 140 mil votos recebidos por Renanzinho, como ele é mais conhecido, fizeram dele o mais votado da bancada alagoana na Câmara. Renanzinho deixou de lado a prefeitura de Murici (AL) e deixou a tarefa de concluir o mandato de prefeito ao seu vice, o tio Remi Calheiros.
Derrotado na eleição ao governo estadual ano passado, Collor já havia fracassado em 2008, quando não conseguiu eleger um de seus filhos, Fernando James, prefeito de Rio Largo (AL), na região metropolitana de Maceió. Arnon Affonso Mello, outro filho do senador, perdeu a eleição para deputado federal em 2002 e deixou a política.
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Neto do ex-deputado e ex-ministro Lindolfo Collor, filho do ex-senador e ex-governador Arnon de Mello, o ex-presidente da República tem dois primos como seus suplentes no Senado, Ada Mello e o ex-deputado Euclydes Mello. A predileção do senador por familiares não é nova. Na Presidência da República, ele indicou a prima economista Zélia Cardoso de Mello ministra da Economia e o primo advogado Marco Aurélio Mello ministro do Supremo Tribunal Federal (STF).
Mídia e poder
Além do interesse pela política, Collor herdou do pai um grupo de veículos de comunicação, que compreende o jornal Gazeta de Alagoas, a afiliada da TV Globo no estado e diversas rádios. O controle dos principais veículos de comunicação também une outras famílias alagoanas com forte inserção na política alagoana e representantes no Congresso. “O controle de mídia vem muito vinculado a esse controle político", diz o professor da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) Alberto Saldanha.
O Sistema Costa Dourada de Radiodifusão, que transmite a CBN em Maceió, por exemplo, é do grupo político de Renan Calheiros. A vinculação com o controle da mídia envolve também outra importante família de políticos alagoana: os Palmeira. A família do deputado Rui Palmeira (PSDB-AL) tem participação no grupo Pajuçara Sistema de Comunicação, que inclui a afiliada do SBT no estado.
Rui Palmeira representa a terceira geração da família no Congresso. Ele carrega o mesmo sobrenome do avô, o ex-senador Rui Soares Palmeira. O deputado é filho do ex-senador, ex-governador e ex-presidente do Tribunal de Contas da União (TCU) Guilherme Palmeira. É sobrinho do ex-deputado federal Vladimir Palmeira (PT-RJ) e do ex-deputado estadual Miguel Palmeira.
Dono da maior fortuna declarada entre todos os 594 congressistas, o deputado João Lyra (PTB-AL) é sócio de rádios e do impresso O Jornal. Os veículos estão entre as dez grandes empresas do parlamentar, que acumula bens no valor de R$ 240 milhões. Uma das filhas dele, Lourdinha Lyra (PR) é vice-prefeita de Maceió. O deputado também é pai da “musa” do impeachment de Collor, a ex-cunhada do ex-presidente Thereza Collor, viúva do irmão de Collor, Pedro, autor das denúncias.
Processos e prisões
Assim como Renan, o senador Benedito de Lira (PP-AL) também tem um herdeiro na Câmara. Padrasto do vereador Marcelo Palmeira, de Maceió, Benedito conseguiu eleger seu filho Arthur de Lira (PP-AL) para seu primeiro mandato federal. Arthur foi um dos 15 deputados estaduais indiciados na Operação Taturana, deflagrada em 2007 pela Polícia Federal. Segundo a PF, o grupo de deputados estaduais fraudou a folha de pagamento da Assembleia Legislativa e desviou R$ 302 milhões dos cofres públicos.
A operação resultou na prisão de 38 pessoas entre parlamentares, ex-parlamentares, funcionários da Assembleia e empresários. Além de Arthur, que conseguiu vaga na Câmara, outros seis deputados estaduais acusados pela PF conseguiram se reeleger no ano passado. Em 2008, Arthur chegou a ser preso, acusado de desobedecer uma ordem judicial relacionada a um outro processo, por agressão física, movido pela ex-mulher. A prisão, no entanto, foi revogada horas depois pela Assembleia Legislativa.
Deputado estadual foragido
Também acusado de desviar recursos da Assembleia, o ex-deputado estadual João Beltrão (PRTB-AL) é irmão do deputado federal Joaquim Beltrão (PMDB-AL). João Beltrão vive uma situação insólita: está foragido da Justiça, acusado de homicídio, mas pode reassumir a vaga no parlamento estadual a qualquer momento.
Os mais de 30 mil votos que recebeu em outubro eram mais que suficientes para sua reeleição, mas ele foi barrado pela Lei da Ficha Limpa. Com a derrubada da lei pelo STF, João se prepara para voltar à Assembleia e escapar da prisão, decretada em fevereiro. Ele é acusado de participar, junto com outros dois ex-parlamentares, do assassinato do ex-cabo da Polícia Militar (PM) José Gonçalves, em 1996. João responde, ainda, por outras três acusações de homicídio, em Maceió e no interior do Maranhão e do Tocantins.
A família Beltrão tem forte base eleitoral no sul do estado. Os irmãos João e Joaquim Beltrão são tios dos prefeitos de Coruripe (AL), Marx Beltrão, e Jequiá da Praia (AL), Marcelo Beltrão, e do ex-prefeito de Penedo (AL) Március Beltrão.
Política em família
Os outros dois parlamentares de Alagoas com parentes na política são os deputados Maurício Quintella Lessa (PR-AL) e Célia Rocha (PTB-AL). Célia é mãe do vereador de Arapiraca (AL) Daniel Rocha (PTB). Maurício é filho do ex-secretário estadual de Educação José Márcio Malta Lessa e primo do ex-governador Ronaldo Lessa.
A prática de eleger parentes também é recorrente na Assembleia Legislativa de Alagoas, assim como em boa parte dos estados brasileiros, diz o jornalista Ricardo Motta, que há 30 anos cobre a política alagoana. "Você tem boas exceções. Mas a regra é a seguinte: o filho não dá para nada, vai ser vereador ou deputado estadual. Há uma 'bancada do papai' na Assembleia Legislativa, formada sobretudo por parlamentares inexpressivos, que nunca fizeram nada de relevante", afirma o analista político. "Nascem e são criados para isso. Parece que não encontram outra profissão", acrescenta.
Alagoas aparece ao lado da Paraíba e do Rio Grande do Norte como um dos três estados com mais parlamentares federais vindos de famílias de políticos, conforme levantamento feito pelo Congresso em Foco apresentado nesta série de reportagens. Uma mostra da força das oligarquias políticas brasileiras, e de como o parentesco entre os políticos cresceu no Congresso como resultado das eleições do ano passado.
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Fonte: http://congressoemfoco.uol.com.br/noticia.asp?cod_canal=21&cod_publicacao=36648
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